domingo, 4 de julho de 2010

Os Dois Horizontes


Dois horizontes fecham nossa vida:
Um horizonte, — a saudade do que não há de voltar;
Outro horizonte, — a esperança dos tempos que hão de chegar;
No presente, — sempre escuro, — Vive a alma ambiciosa,
Na ilusão voluptuosa;
Do passado e do futuro.
Os doces brincos da infância,
Sob as asas maternais,
O vôo das andorinhas, a onda viva e os rosais;
O gozo do amor, sonhado,
Num olhar profundo e ardente, tal é na hora presente,
O horizonte do passado. Ou ambição de grandeza
Que no espírito calou, desejo de amor sincero,
Que o coração não gozou;
Ou um viver calmo e puro,
À alma convalescente, tal é na hora presente,
O horizonte do futuro.
No breve correr dos dias,
Sob o azul do céu, — tais são limites no mar da vida: Saudade ou aspiração;
Ao nosso espírito ardente, na avidez do bem sonhado,
Nunca o presente é passado, nunca o futuro é presente.
Que cismas, homem? – Perdido no mar das recordações, escuto um eco sentido,
Das passadas ilusões.
Que buscas, homem? – Procuro, através da imensidade, ler a doce realidade,
Das ilusões do futuro. Dois horizontes fecham nossa vida.


Machado de Assis, in 'Crisálidas'

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